O COVID-19 E AS MEDIDAS TRABALHISTAS DE ENFRENTAMENTO DA CRISE
BOSISIO ADVOGADOS, atento aos desdobramentos da crise provocada pela pandemia COVID-19, oferece a clientes e amigos o presente material informativo, com os aspectos que consideramos os mais fundamentais para a boa compreensão dos impactos jurídicos que as relações de trabalho já vêm sofrendo em nosso país.
A partir da apresentação de todo o contexto normativo atualmente em vigor para o enfrentamento da crise no campo trabalhista, com detalhada análise das Medidas Provisórias 927, 928 e 936, este informativo procurará abordar, de maneira prática e objetiva, os principais pontos de atenção para os quais empregadores e empregados deverão voltar seus olhos neste difícil momento que atravessamos.
SUMÁRIO
• CONTEXTO NORMATIVO
• A MEDIDA PROVISÓRIA Nº 927 DE 22 DE MARÇO DE 2020
• A MEDIDA PROVISÓRIA Nº 936 DE 1º DE ABRIL DE 2020
• BREVES APONTAMENTOS SOBRE AS MEDIDAS PROVISÓRIAS
CONTEXTO NORMATIVO
Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020:
•Dispõe sobre as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus responsável pelo surto de 2019.
Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020:
• Reconheceu a ocorrência do estado de calamidade pública, nos termos da solicitação do Presidente da República encaminhada por meio da Mensagem nº 93, de 18 de março de 2020. Este Decreto Legislativo determina que o estado de calamidade pública tem efeitos até 31 de dezembro de 2020. Trata-se de medida relacionada ao esforço internacional de combate ao Covid-19.
Medida Provisória nº 927, de 22 de março de 2020:
• Dispõe sobre as medidas trabalhistas para enfrentamento do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020, e da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus (covid-19), e dá outras providências.
Medida Provisória nº 936, de 1º de abril de 2020:
• Institui o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda e dispõe sobre medidas trabalhistas complementares para enfrentamento do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020, e da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus (covid-19), de que trata a Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, e dá outras providências.
A MEDIDA PROVISÓRIA Nº 927 DE 22 DE MARÇO DE 2020
A ESTRUTURA DA MEDIDA PROVISÓRIA
A MP nº 927/2020 foi dividida em 12 capítulos:
1. Alternativas trabalhistas para enfrentamento do estado de calamidade pública e da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus;
2. Teletrabalho;
3. Antecipação de férias individuais;
4. Concessão de férias coletivas;
5. Aproveitamento e antecipação de feriados;
6. Banco de horas;
7. Suspensão de exigências administrativas em segurança e saúde no trabalho;
8. Direcionamento do trabalhador para qualificação;
9. Deferimento do recolhimento do FGTS;
10. Outras disposições em matéria trabalhista;
11. Antecipação do abono anual de 2020;
12. Disposições finais.
CAPÍTULO I
ALTERNATIVAS TRABALHISTAS PARA ENFRENTAMENTO DO ESTADO DE CALAMIDADE PÚBLICA E DA EMERGÊNCIA DE SAÚDE PÚBLICA DE IMPORTÂNCIA INTERNACIONAL DECORRENTE DO CORONAVÍRUS (COVID-19)
A Medida Provisória nº 927 permite a adoção de providências pelos empregadores durante o período de calamidade pública decorrente da pandemia do Covid-19.
A Medida Provisória afirma ser a pandemia, para fins trabalhistas, hipótese de força maior, nos termos do artigo 501 da CLT.
Durante o estado de calamidade pública, o empregado e o empregador poderão celebrar acordo individual escrito, a fim de garantir a permanência do vínculo empregatício, que terá preponderância sobre os demais instrumentos normativos, legais e negociais, respeitados os limites estabelecidos na Constituição.
Poderão ser adotadas pelos empregadores, dentre outras, as seguintes medidas:
1. O teletrabalho;
2. A antecipação de férias individuais;
3. A concessão de férias coletivas;
4. O aproveitamento e a antecipação de feriados;
5. O banco de horas;
6. A suspensão de exigências administrativas em segurança e saúde no trabalho;
7. O direcionamento do trabalhador para qualificação;
8. O diferimento do recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS.
CAPÍTULO II
DO TELETRABALHO
A Medida Provisória nº 927 equipara: teletrabalho, trabalho remoto ou trabalho a distância. Todos os termos se referem a prestação de serviços: (i) preponderante ou totalmente fora das dependências do empregador; (ii) com a utilização de tecnologias da informação e comunicação; e (iii) que, por sua natureza, não configurem trabalho externo.
Na modalidade de teletrabalho, o empregador está isento de controlar a jornada dos empregados.
O empregador poderá, a seu critério, alterar o regime de trabalho presencial para o teletrabalho, o trabalho remoto ou outro tipo de trabalho a distância, sem necessidade de acordo individual ou coletivo.
O empregador poderá determinar o retorno ao regime de trabalho presencial, independentemente da existência de acordos individuais ou coletivos, dispensado o registro prévio da alteração no contrato individual de trabalho.
As duas alterações acima deverão ser comunicadas ao empregado com antecedência mínima de 48 horas, por escrito ou por meio eletrônico.
As disposições relativas à responsabilidade pela aquisição, pela manutenção ou pelo fornecimento dos equipamentos tecnológicos e da infraestrutura necessária e adequada à prestação do teletrabalho e ao reembolso de despesas arcadas pelo empregado serão previstas em contrato escrito, firmado previamente ou no prazo de trinta dias, contado da data da mudança do regime de trabalho.
Se o empregado não possuir os equipamentos tecnológicos e a infraestrutura necessária e adequada à prestação do teletrabalho:
(i) o empregador poderá fornecer os equipamentos em regime de comodato e pagar por serviços de infraestrutura, que não caracterizarão verba de natureza salarial; ou
(ii) na impossibilidade do oferecimento do regime de comodato de que trata o inciso I, o período da jornada normal de trabalho será computado como tempo de trabalho à disposição do empregador.
O tempo de uso de aplicativos e programas de comunicação fora da jornada de trabalho normal do empregado não constitui tempo à disposição, regime de prontidão ou de sobreaviso, exceto se houver previsão em acordo individua ou coletivo.
Permitida a adoção do regime de teletrabalho para estagiários e aprendizes, nos termos do disposto neste Capítulo.
CAPÍTULO III
DA ANTECIPAÇÃO DE FÉRIAS INDIVIDUAIS
O empregado deverá ser informado a respeito da antecipação de suas férias com antecedência de, no mínimo, quarenta e oito horas.
O aviso poderá ser feito por escrito ou por meio eletrônico, sendo necessária a indicação do período a ser gozado pelo empregado.
As férias não poderão ser gozadas em tempo inferior a cinco dias úteis.
As férias poderão ser concedidas por ato do empregador, ainda que o período aquisitivo a elas relativo não tenha transcorrido.
Será possível a negociação, entre empregado e empregador, da antecipação de férias futuras, desde que haja acordo individual escrito.
Os trabalhadores considerados pertencentes ao grupo de risco do Covid-19 deverão ter preferência na antecipação das férias individuais ou coletivas, em relação aos demais empregados.
Será possível que o empregador suspenda as férias ou licenças não remuneradas dos profissionais da área de saúde ou daqueles que desempenhem funções essenciais. Isso deverá ser feito mediante comunicação formal da decisão ao trabalhador, por escrito ou por meio eletrônico, preferencialmente com antecedência de quarenta e oito horas.
Se o empregador conceder férias durante o período de calamidade pública, poderá optar por efetuar o pagamento do adicional de um terço de férias após sua concessão, até a data em que é devida a gratificação natalina (20 de dezembro).
Caso o empregado peça a conversão de um terço de férias em abono pecuniário, o requerimento estará sujeito à concordância do empregador, sendo possível o pagamento do terço constitucional até 20 de dezembro.
O pagamento da remuneração das férias concedidas em razão do estado de calamidade poderá ser efetuado até o quinto dia útil do mês subsequente ao início do gozo das férias. Não se aplica, portanto, a regra que obriga o empregador a efetuar o pagamento até dois dias antes do gozo das férias do empregado.
Se o empregado for dispensado, este deverá receber, junto com as verbas rescisórias, os valores relativos às férias ainda não pagas.
CAPÍTULO IV
DA CONCESSÃO DE FÉRIAS COLETIVAS
O empregador poderá, a seu critério, conceder férias coletivas.
A comunicação da referida decisão aos empregados afetados deverá ser feita com antecedência de, no mínimo, quarenta e oito horas.
De acordo com o disposto na CLT, as férias coletivas: (i) poderão ser gozadas em dois períodos anuais; (ii) sendo que nenhum deles poderá ser inferior a 10 (dez) dias. No entanto, tais regras não se aplicam durante o estado de calamidade.
Não haverá a necessidade de comunicação prévia ao órgão local do Ministério da Economia, como normalmente se deve fazer, conforme determina a CLT.
Não haverá a necessidade de comunicação aos sindicatos representativos da categoria profissional, como normalmente se deve fazer, conforme preleciona a CLT.
CAPÍTULO V
DO APROVEITAMENTO E DA ANTECIPAÇÃO DE FERIADOS
Os empregadores poderão antecipar o gozo de feriados não religiosos federais, estaduais, distritais e municipais.
A opção pela antecipação dos referidos feriados deverá ser comunicada, por escrito ou por meio eletrônico, ao conjunto de empregados afetados com antecedência de, no mínimo, quarenta e oito horas.
Deverá haver indicação expressa dos feriados aproveitados.
Os feriados poderão ser utilizados para compensação do saldo em banco de horas.
O aproveitamento de feriados religiosos dependerá de concordância do empregado, mediante manifestação em acordo individual escrito.
CAPÍTULO VI
DO BANCO DE HORAS
Ficam autorizadas a interrupção das atividades pelo empregador e a constituição de regime especial de compensação de jornada, por meio de banco de horas, em favor do empregador ou do empregado.
O banco de horas poderá ser estabelecido por meio de acordo coletivo ou individual formal.
A compensação das horas poderá ser feita no prazo de até dezoito meses, contado da data de encerramento do estado de calamidade pública.
A compensação de tempo para recuperação do período interrompido poderá ser feita mediante prorrogação de jornada em até duas horas, observado o limite de dez horas diárias. Esse sistema especial de compensação não está restrito ao cumprimento do módulo semanal de 44 horas.
A compensação do saldo de horas poderá ser determinada pelo empregador independentemente de convenção coletiva ou acordo individual ou coletivo.
CAPÍTULO VII
DA SUSPENSÃO DE EXIGÊNCIAS ADMINISTRATIVAS EM SEGURANÇA E SAÚDE NO TRABALHO
Durante o estado de calamidade pública, fica suspensa a obrigatoriedade de
realização dos exames médicos ocupacionais, clínicos e complementares, exceto
dos exames demissionais.
Os exames médicos ocupacionais, clínicos e complementares deverão ser
realizados no prazo de sessenta dias, contado da data de encerramento do estado
de calamidade pública.
Na hipótese de o médico coordenador de programa de controle médico e saúde ocupacional considerar que a prorrogação representa risco para a saúde do empregado, o médico indicará ao empregador a necessidade de sua realização.
O exame demissional poderá ser dispensado caso o exame médico ocupacional mais recente tenha sido realizado há menos de cento e oitenta dias.
Durante o estado de calamidade pública, fica suspensa a obrigatoriedade de
realização de treinamentos periódicos e eventuais dos atuais empregados. Porém
esses treinamentos deverão ser realizados no prazo de noventa dias, contado da
data de encerramento do estado de calamidade pública.
Os treinamentos acima referidos poderão ser realizados na modalidade de ensino a distância.
As comissões internas de prevenção de acidentes (CIPAs) poderão ser mantidas até o encerramento do estado de calamidade pública e os processos eleitorais em curso poderão ser suspensos.
CAPÍTULO VIII
DO DIRECIONAMENTO DO TRABALHADOR PARA QUALIFICAÇÃO
O capítulo VIII da Medida Provisória nº 927 foi revogado pela Medida Provisória nº 928, publicada no dia 23 de março de 2020.
Neste capítulo, previa-se a possibilidade de suspensão, por até quatro meses, para participação do empregado em curso ou programa de qualificação profissional não presencial oferecido pelo empregador, diretamente ou por meio de entidades responsáveis pela qualificação, com duração equivalente à suspensão contratual.
Diante da revogação exclusiva do referido Capítulo, a previsão do inciso VII, do art. 3º, da MP 927, que não foi objeto de expressa revogação, deverá ser, necessariamente, conjugada com a previsão do art. 476-A, da CLT.
CAPÍTULO IX
DO DIFERIMENTO DO RECOLHIMENTO DO FUNDO DE GARANTIA DO TEMPO DE SERVIÇO
Fica suspensa a exigibilidade do recolhimento do FGTS pelos empregadores, referente às competências de março, abril e maio de 2020, com vencimento em abril, maio e junho de 2020, respectivamente.
Os empregadores poderão fazer uso dessa prerrogativa independentemente: (i) do número de empregados; (ii) do regime de tributação; (iii) da natureza jurídica; (iv) do ramo de atividade econômica; e (v) da adesão prévia.
O recolhimento das competências de março, abril e maio de 2020 poderá ser realizado de forma parcelada, sem a incidência da atualização, da multa e dos encargos previstos no art. 22 da Lei nº 8.036, de 11 de maio de 1990.
O pagamento das obrigações referentes às competências deverá ser quitado em até seis parcelas mensais, com vencimento no sétimo dia de cada mês, a partir de julho de 2020. O inadimplemento dessas parcelas ensejará o bloqueio do certificado de regularidade do FGTS.
Para usufruir da prerrogativa prevista no caput, o empregador fica obrigado a declarar as informações, até 20 de junho de 2020, sendo que:
I – as informações prestadas constituirão declaração e reconhecimento dos
créditos delas decorrentes, caracterizarão confissão de débito e constituirão
instrumento hábil e suficiente para a cobrança do crédito de FGTS; e
II – os valores não declarados serão considerados em atraso, e obrigarão o
pagamento integral da multa e dos encargos devidos nos termos do disposto
no art. 22 da Lei nº 8.036, de 1990, que prevê a incidência da TR sobre as
importâncias em atraso, juros de mora de 0,5% a.m. (cinco décimos por cento
ao mês), entre outros.
Na hipótese de rescisão do contrato de trabalho, a suspensão da exigibilidade do FGTS acima mencionada ficará resolvida e o empregador ficará obrigado:
I – ao recolhimento dos valores correspondentes, sem incidência de multa e
encargos, caso seja efetuado dentro do prazo legal estabelecido para sua
realização; e
II – a realizar os depósitos referentes ao mês da rescisão e ao imediatamente
anterior, que ainda não houver sido recolhido, sem prejuízo das cominações
legais.
Havendo a rescisão do contrato de trabalho, as eventuais parcelas vincendas terão sua data de vencimento antecipada para o prazo aplicável ao recolhimento previsto no art. 18 da Lei nº 8.036, de 1990, que prevê que “ocorrendo rescisão do contrato de trabalho, por parte do empregador, ficará este obrigado a depositar na conta vinculada do trabalhador no FGTS os valores relativos aos depósitos referentes ao mês da rescisão e ao imediatamente anterior, que ainda não houver sido recolhido, sem prejuízo das cominações legais”.
Caso inadimplidas as parcelas cuja exigibilidade foi suspensa, estarão sujeitas à multa e aos encargos devidos nos termos do disposto no art. 22 da Lei nº 8.036, de 1990, que prevê a incidência da TR sobre as importâncias em atraso, juros de mora de 0,5% a.m. (cinco décimos por cento ao mês), entre outros.
Fica suspensa a contagem do prazo prescricional dos débitos relativos a contribuições do FGTS pelo prazo de cento e vinte dias, contado da data de entrada em vigor desta Medida Provisória.
Os prazos dos certificados de regularidade emitidos anteriormente à data de entrada em vigor desta Medida Provisória serão prorrogados por noventa dias.
Os parcelamentos de débito do FGTS em curso que tenham parcelas a vencer nos meses de março, abril e maio não impedirão a emissão de certificado de regularidade.
CAPÍTULO X
OUTRAS DISPOSIÇÕES EM MATÉRIA TRABALHISTA
Durante o de estado de calamidade pública é permitido aos estabelecimentos de saúde, mediante acordo individual escrito, mesmo para as atividades insalubres e para a jornada de doze horas de trabalho por trinta e seis horas de descanso:
I – prorrogar a jornada de trabalho, nos termos do disposto no art. 61 da
Consolidação das Leis do Trabalho; e
II – adotar escalas de horas suplementares entre a décima terceira e a vigésima
quarta hora do intervalo interjornada, sem que haja penalidade administrativa,
garantido o repouso semanal remunerado nos termos do disposto no art. 67
da Consolidação das Leis do Trabalho.
As horas suplementares computadas em decorrência da adoção das medidas acima previstas poderão ser compensadas, no prazo de dezoito meses, contado da data de encerramento do estado de calamidade pública, por meio de banco de horas ou remuneradas como hora extra.
Durante o período de cento e oitenta dias, contado da data de entrada em vigor desta Medida Provisória, os prazos processuais para apresentação de defesa e recurso no âmbito de processos administrativos originados a partir de autos de infração trabalhistas e notificações de débito de FGTS ficam suspensos.
Os casos de contaminação pelo coronavírus (covid-19) não serão considerados ocupacionais, exceto mediante comprovação do nexo causal.
Os acordos e as convenções coletivos vencidos ou vincendos, no prazo de cento e oitenta dias, contado da data de entrada em vigor desta Medida Provisória, poderão ser prorrogados, a critério do empregador, pelo prazo de noventa dias, após o termo final deste prazo.
Durante o período de cento e oitenta dias, contado da data de entrada em vigor da Medida Provisória, os Auditores Fiscais do Trabalho do Ministério da Economia atuarão de maneira orientadora, exceto quanto às seguintes irregularidades: (i) falta de registro de empregado, a partir de denúncias; (ii) situações de grave e iminente risco, somente para as irregularidades imediatamente relacionadas à configuração da situação; (iii) ocorrência de acidente de trabalho fatal apurado por meio de procedimento fiscal de análise de acidente, somente para as irregularidades imediatamente relacionadas às causas do acidente; e (iv) trabalho em condições análogas às de escravo ou trabalho infantil.
A Medida Provisória se aplica às relações de trabalho regidas (i) pela Lei nº 6.019, de 3 de janeiro de 1974 (que dispõe sobre o trabalho temporário), e (ii) pela Lei nº 5.889, de 8 de junho de 1973 (que regulamenta o trabalho rural).
A Medida Provisória se aplica às relações regidas pela Lei Complementar nº 150/2015 (que regulamenta o trabalho doméstico), tais como jornada, banco de horas e férias.
Não se aplicam aos trabalhadores em regime de teletrabalho, nos termos do disposto nesta Medida Provisória, as regulamentações sobre trabalho em teleatendimento e telemarketing.
CAPÍTULO XI
DA ANTECIPAÇÃO DO PAGAMENTO DO ABONO ANUAL EM 2020
No ano de 2020, o pagamento do abono anual de que trata o art. 40 da Lei nº 8.213/1991 (abono anual ao segurado e ao dependente da Previdência Social que, durante o ano, recebeu auxílio-doença, auxílio-acidente ou aposentadoria, pensão por morte ou auxílio-reclusão) será efetuado em duas parcelas, excepcionalmente, da seguinte forma:
I – a primeira parcela corresponderá a cinquenta por cento do valor do
benefício devido no mês de abril e será paga juntamente com os benefícios
dessa competência; e
II – a segunda parcela corresponderá à diferença entre o valor total do abono
anual e o valor da parcela antecipada e será paga juntamente com os benefício
da competência maio.
Na hipótese de cessação programada do benefício prevista antes de 31 de dezembro de 2020, será pago o valor proporcional do abono anual ao beneficiário. Além disso, sempre que ocorrer a cessação do benefício antes da data programada, para os benefícios temporários, ou antes de 31 de dezembro de 2020, para os benefícios permanentes, deverá ser providenciado o encontro de contas entre o valor pago ao beneficiário e o efetivamente devido.
CAPÍTULO XII
DISPOSIÇÕES FINAIS
A MP convalida todas as medidas trabalhistas adotadas por empregadores que não contrariem o disposto nesta Medida Provisória, tomadas no período dos trinta dias anteriores à data de entrada em vigor desta Medida Provisória.
A MEDIDA PROVISÓRIA Nº 936 DE 1º DE ABRIL DE 2020
CAPÍTULO I
DISPOSIÇÕES PRELIMINARES
A Medida Provisória nº 936 institui o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda.
Dispõe, ainda, sobre medidas trabalhistas complementares para o enfrentamento do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020, e da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus (covid-19) de que trata a Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020.
CAPÍTULO II
DO PROGRAMA EMERGENCIAL DE MANUTENÇÃO DO EMPREGO E DA RENDA CONDIÇÕES GERAIS
O Programa tem como objetivos: a) preservar o emprego e a renda; b) garantir a continuidade das atividades laborais e empresariais; e c) reduzir o impacto social decorrente da pandemia.
São três as medidas previstas no Programa: I) o pagamento do Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda; II) a redução proporcional de jornadas e salários; III) a suspensão temporária dos contratos de trabalho.
A Medida Provisória não se aplica à Administração Pública, direta ou indireta, empresas públicas, sociedades de economia mista, incluindo subsidiárias, bem como aos organismos internacionais.
Será do Ministério da Economia a competência para coordenar, executar, monitorar e avaliar o Programa, bem como editar as normas complementares necessárias a sua implementação.
O Benefício Emergencial será pago ao trabalhador em duas hipóteses: a) redução de jornada com proporcional redução do salário; b) suspensão temporária do contrato de trabalho.
O Benefício Emergencial será inteiramente custeado pela União Federal.
O Benefício Emergencial será pago mensalmente, a partir da data do início da redução da jornada ou da suspensão temporária do contrato de trabalho, conforme o seguinte:
I – a redução da jornada, com proporcional redução do salário, ou a suspensão temporária do contrato deverão ser comunicadas ao Ministério da Economia no prazo de 10 dias, contados da celebração do acordo;
II – caso observado corretamente o prazo acima, a primeira parcela do Benefício será paga no prazo de 30 dias, contados da data em que a informação tiver sido regularmente encaminhada ao Ministério da Economia;
III – o Benefício será pago apenas enquanto durar a redução da jornada ou a suspensão do contrato de trabalho.
A ausência de comunicação ao Ministério da Economia implicará o pagamento do salário normal e o recolhimento dos respectivos encargos, enquanto a irregularidade não for sanada.
ALERTA IMPORTANTE: O Ministério da Economia ainda editará normas para disciplinar como se dará o envio das informações pelos empregadores, bem como a efetivação do pagamento dos Benefícios Emergenciais. Nesse sentido, recomenda-se aguardar a provável edição, nos próximos dias, de portaria ou outro ato normativo que regulamente os indispensáveis procedimentos formais acima indicados.
O pagamento do Benefício não impedirá o gozo do benefício do seguro desemprego futuramente, caso o trabalhador a ele fizer jus, na hipótese de uma dispensa.
O pagamento indevido do Benefício implicará a inscrição daquele que o recebeu na Dívida Ativa da União.
A base de cálculo do Benefício Emergencial é o valor do seguro-desemprego a que o trabalhador teria direito, na hipótese de uma demissão, na forma da Lei 7.998/1990, conforme o quadro abaixo:
Efetuar a média dos 3 últimos salários
Até R$ 1.599,61 multiplica-se salário médio por 0,80 (80%)
De R$ 1.599,62 até 2.666,29 o que exceder a 1.599,61 multiplica-se por 0,50
(50%) e soma-se a 1.279,69
Acima de R$ 2.666,29 o valor da parcela será de 1.813,03
Portanto, o valor máximo do Benefício Emergencial a ser custeado pelo Estado é de R$ 1.813,03.
Na hipótese de redução de jornada e de salário, será aplicado o percentual de redução sobre a base de cálculo acima mencionada.
Na hipótese de suspensão temporária do contrato de trabalho:
I – o Benefício será de 100% do seguro-desemprego a que ele teria direito, caso fosse demitido, na hipótese de empresas com receita bruta de até 4,8 milhões de reais;
III – o Benefício será de 70% do seguro-desemprego a que ele teria direito, caso fosse demitido, na hipótese de empresas com receita bruta superior a 4,8 milhões de reais.
Não há nenhuma condição para o recebimento do Benefício Emergencial que não seja o fato de o cidadão ser empregado. Não há prazos de carência, ou exigência de um período mínimo de contrato de trabalho.
Não terá direito ao Benefício Emergencial o trabalhador que: a) exercer cargo ou emprego público, cargo público de livre nomeação e titular de mandato eletivo; b) estiver em gozo do benefício do seguro-desemprego; c) estiver em gozo dos benefícios do Regime Geral da Previdência Social, exceto a pensão por morte e o auxílio acidente; d) estiver em gozo da bolsa de qualificação profissional prevista na Lei 7.998/1990.
Será possível receber tantos Benefícios Emergenciais quantos forem os vínculos empregatícios que o trabalhador possuir em que houverem sido formalizados acordos de redução de jornada e salário e/ou suspensão temporária do contrato, observado o valor teto do Benefício de R$ 600,00 se um dos contratos em vigor for na modalidade de contrato intermitente.
REDUÇÃO DA JORNADA E DO SALÁRIO
O acordo com previsão de redução do salário, com proporcional redução da jornada, que poderá durar até 90 dias, deverá observar o seguinte:
I – preservação do salário-hora;
II – a pactuação para redução de jornada e salário poderá ser procedida por acordo individual escrito, a ser encaminhado ao empregado com no mínimo dois dias de antecedência, exclusivamente nos percentuais de 25%, 50% ou 70%, desde que receba o empregado salário igual ou inferior a R$ 3.135,00, ou seja portador de diploma de nível superior, com salário igual ou superior a duas vezes o teto dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social.
III – a redução cessará: a) dois dias após findo oficialmente o estado de calamidade; b) na data ajustada no acordo individual; ou ainda c) na data em que o empregador definir, caso queira antecipar a retomada da jornada contratual normal.
SUSPENSÃO TEMPORÁRIA DO CONTRATO
A suspensão do contrato de trabalho poderá ser ajustada por até 60 dias, que poderão ser fracionados em dois períodos de 30 dias.
Durante a suspensão, o trabalhador continuará fazendo jus a todos os benefícios concedidos pelo empregador aos seus empregados.
Durante o período da suspensão, o trabalhador poderá continuar recolhendo INSS, na qualidade de segurado facultativo.
A suspensão cessará: a) dois dias após cessado oficialmente o estado de calamidade; b) na data ajustada no acordo individual; ou ainda c) na data em que o empregador definir, caso queira antecipar a retomada da jornada contratual normal.
É proibido ao empregador exigir qualquer serviço do empregado com contrato de trabalho suspenso, em qualquer modalidade, parcial ou integralmente, mesmo à distância ou por teletrabalho. A não observância de tal regra implicará o pagamento imediato dos salários devidos e os respectivos encargos referentes a todo o período pactuado para a suspensão, além de outras penalidades previstas na legislação e/ou em acordos e convenções coletivas.
As empresas com receita bruta superior a 4,8 milhões de reais só poderão suspender os contratos de trabalho de seus empregados mediante o pagamento de uma ajuda compensatória, em valor equivalente a 30% de seus salários, observado o prazo máximo de 60 dias.
AJUDA COMPENSATÓRIA E GARANTIA PROVISÓRIA NO EMPREGO
A ajuda compensatória paga pelo empregador deve ser ajustada no acordo individual ou no acordo coletivo, conforme o caso (redução da jornada ou suspensão do contrato de trabalho).
A ajuda compensatória tem natureza indenizatória.
A ajuda compensatória paga pelo empregador não integra a base de cálculo do Imposto de Renda, do INSS e do FGTS, podendo ainda ser excluída do lucro líquido para efeito de cálculo do Imposto de Renda da pessoa jurídica e da Contribuição Social Sobre Lucro Líquido.
O trabalhador que receber o Benefício Emergencial terá garantia de emprego pelo período correspondente à soma do período de recebimento do Benefício com o período imediatamente posterior, em igual proporção.
A dispensa sem justa causa durante o período de garantia no emprego obrigará o empregador a pagar, além das verbas rescisórias:
I – 50% do salário a que o empregado teria direito no período restante da garantia, caso a redução da jornada tenha sido ajustada em percentual igual ou superior a 25% e inferior a 50%;
II – 75% do salário a que o empregado teria direito no período restante da garantia, caso a redução da jornada tenha sido ajustada em percentual igual ou superior a 50% e inferior a 70%.
III – 100% do salário a que o empregado teria direito no período restante da garantia, caso a redução da jornada tenha sido ajustada em percentual igual ou superior a 70%, ou nos casos de suspensão temporária do contrato.
Não há qualquer penalidade se a dispensa se der a pedido ou se o empregado for dispensado por justa causa.
NEGOCIAÇÃO COLETIVA
A redução do salário e da jornada, e a suspensão temporária dos contratos de trabalho poderão ser ajustadas mediante negociação coletiva. Nesta hipótese, no caso específico da redução da jornada e do salário, poderão ser adotados percentuais diversos daqueles previstos para os acordos individuais.
Em caso de ajuste de redução de salário e jornada inferior a 25%, mediante norma coletiva, não haverá pagamento do Benefício Emergencial.
Se a redução for ajustada em percentual situado entre 25 e 50%, o Benefício será de 25% sobre o seguro-desemprego a que o empregado teria direito, na hipótese de uma demissão sem justa causa.
Se a redução for ajustada em percentual situado entre 50 e 70%, o Benefício será de 50% sobre o seguro-desemprego a que o empregado teria direito, na hipótese de uma demissão sem justa causa.
Se a redução for ajustada em percentual superior 70%, o Benefício será de 70% sobre o seguro-desemprego a que o empregado teria direito, na hipótese de uma demissão sem justa causa.
A Medida Provisória permite que acordos ou convenções coletivas negociados anteriormente sejam repactuados, para adequação a seus termos, no prazo de 10 dias contados de sua edição.
COMUNICAÇÃO AO SINDICATO
Os acordos individuais escritos para redução de jornada/salário e de suspensão temporária do contrato deverão ser comunicados ao sindicato da categoria profissional no prazo de 10 dias contados de sua celebração.
INFLUÊNCIA DO PATAMAR SALARIAL PARA CELEBRAÇÃO DOS ACORDOS DE FORMA INDIVIDUAL OU COLETIVA
Os acordos de redução de jornada/salário e de suspensão temporária dos contratos podem ser feitos, por acordos individuais ou coletivos, com empregados que ganhem até R$ 3.135,00, ou ainda com os empregados que receberem salários superiores a duas vezes o teto do Regime Geral da Previdência Social e possuírem diploma de nível superior.
Para os demais trabalhadores, os acordos só poderão ser feitos pela via da negociação coletiva, ressalvada a redução da jornada/salário de 25%, que poderá ser ajustada individualmente.
OUTRAS CONSIDERAÇÕES
Acordos de redução da jornada e/ou de suspensão temporária dos contratos deverão observar a manutenção da prestação de serviços públicos e as atividades essenciais previstas inclusive na Lei 13.979/2020.
Eventuais irregularidades serão punidas com as multas previstas na Lei 7.998/1990 (lei do seguro-desemprego).
Na fiscalização do cumprimento das regras previstas nesta Medida Provisória, não se aplica o critério da dupla visita e nem a exclusiva atuação orientadora prevista na Medida Provisória nº 927, por parte das autoridades de fiscalização da Secretaria Especial do Trabalho do Ministério da Economia (adoção de critérios mais rígidos de fiscalização).
A Medida Provisória se aplica aos contratos de aprendizagem e por tempo parcial.
O prazo máximo de redução da jornada e de suspensão, caso sejam ajustados cumulativamente para um mesmo empregado, ainda que sucessivamente, é de 90 dias, reiterando-se que o prazo máximo de suspensão temporária do contrato é de apenas 60 dias.
CAPÍTULO III
DISPOSIÇÕES FINAIS
Durante o período de calamidade pública, os cursos de Qualificação Profissional previstos no art. 476-A, da CLT, só poderão ser ministrados na modalidade não presencial e terão duração não inferior a um mês e não superior a três meses.
A Medida Provisória flexibiliza os requisitos formais exigidos pela CLT para a entabulação de negociações coletivas, admitindo, por exemplo, a realização de assembleias por meios telemáticos (artigo 17, II, da Medida Provisória 936/2020).
O Benefício Emergencial do empregado com contrato intermitente tem teto de R$600,00. No caso do intermitente, o Benefício será pago no prazo de 30 dias após a publicação da Medida Provisória, procedimento esse que também depende de regulamentação por ato de exclusiva competência do Ministério da Economia.
O trabalhador com dois ou mais contratos intermitentes só terá direito a um Benefício Emergencial, no teto acima mencionado.
Por fim, a Medida Provisória se remete a MP 927, para alertar que a suspensão das exigências administrativas de segurança do trabalho não autoriza o descumprimento das normas relativas a segurança e saúde do trabalhador.
BREVES APONTAMENTOS SOBRE AS MEDIDAS PROVISÓRIAS 927 E 936 DE 2020
As Medidas Provisórias 927 e 936 têm claro fundamento na relativização momentânea de diretos e deveres de empregados e empregadores, durante o estado de calamidade, na busca do objetivo comum de preservação da atividade econômica e dos empregos.
O enquadramento, pela Medida Provisória nº 927, e, em boa medida, também pela Medida Provisória nº 936, do acordo individual em patamar superior às leis e, ressalvadas determinadas hipóteses, às normas coletivas, se justifica pelo momento de crise, não prescindindo, entretanto, de rigorosa observância dos princípios de lealdade e boa-fé.
O Supremo Tribunal Federal, por meio de decisões monocráticas do Ministro Marco Aurélio de Mello, já indeferiu dois pedidos de liminares em Ações Diretas de Inconstitucionalidade, formuladas em face da Medida Provisória nº 927/2020. Portanto, até que o plenário do STF se reúna para discutir as alegadas inconstitucionalidades, a Medida Provisória se mantém perfeitamente hígida. Aguarda-se, desta feita, a apreciação pelo STF de novas Ações que já questionam a constitucionalidade também da Medida Provisória nº 936.